2 de julho de 2017

Tempo que foge...


Tempo,
Tu que foges mais rápido que o vento,
Não te sei usar,
Meu tempo.

Sempre, dia após dia, 
Afligindo-me,
Que o tempo passa
E só a lembrança fica.

Bates forte em mim,
Oh Senhor das pressas,
Tu que nunca regressas 
E nada me deixas a mim.

Enfim te deixo
Porque não te tenho.
Acolhe este desabafo,
Que tu não voltas, mas eu já venho…

Rafael Sousa, 12º B

13 de junho de 2017

CAMÕES DE VOLTA

Painel de azulejos, Júlio Pomar, 1926 - Museu Nacional do Azulejo
Estava eu muito descansada a comer no McDonalds e a pensar quem seria a próxima “vítima” que iria entrevistar, quando me deparei com algo extraordinário : um senhor a citar versos d’Os Lusíadas. Mas citava de tal forma, como se os tivesse escrito ou tivesse estado presente naquela época. Já tinha visto aquela cara nalgum lado… Então apercebi-me, era Luís de Camões! No século XXI! Fui ter com ele, claro! O Poeta disponibilizou-se a responder a umas perguntas.

AL-Como considera que os portugueses o veem ou o que acha que eles pensam de si?
LC-”Julga-me a gente toda por perdido.”

AL- Não considera que tenha havido alguma evolução quanto ao reconhecimento dos portugueses face às letras e às artes?
LC-”quem não sabe a arte, não na estima.”

AL- Escreveu muitos poemas de amor. Considera-se um apaixonado?
LC-” está no pensamento como ideia :/e o vivo e puro amor de que sou feito.”

AL- Se tivesse de resumir os seus poemas amorosos, como o faria? O que é para si o amor?
LC-”Amor é fogo que arde sem se ver”

AL- Como é para si a mulher ideal?
LC- ”linda e pura semideia.”

AL- Já deve estar a par das ”modernices” deste século. As pessoas sentem cada vez mais a influência das tecnologias, nas suas vidas. Decerto que se ficasse aqui mais tempo seriam muitas as selfies que lhe pediriam para tirar. O que acha disso?
LC- ”Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”.

AL - É pela vontade ou pela necessidade das pessoas quererem valorizar o seu trabalho que criaram, no dia de hoje, 10 de junho, um feriado nacional conhecido como “Dia de Camões e das Comunidades”. Como se sente acerca disso?
LC- “Quão doce é o louvor e a justa glória/Dos próprios feitos, quando são soados!”

E terminei assim a minha entrevista, mas posso dizer que a conversa não ficou por aqui, pois eu fiz questão de que Luís de Camões comesse um hambúrguer comigo. E o resto, o resto é história!...

Alice Luís 10ºD

10 de junho de 2017

Entrevista inesperada a Luís de Camões

Camões, pintura de José Malhoa
No contexto do dia 10 de junho, no qual se celebra o dia de Camões e de Portugal, decidi entrevistar o próprio Luís Vaz de Camões. Confesso que no início não sabia como “contactá-lo” e até já tinha perguntado a algumas pessoas como haveria de o fazer. Como continuava sem resposta, comecei a pensar em desistir. Até que um dia, ao chegar a casa, deitei-me na minha cama, a pensar numa solução, e acabei por adormecer. Qual não foi o meu espanto, quando Luís de Camões me apareceu em sonhos. Estava à minha janela, a chamar pelo meu nome e, quando apareci, disse-me: “Bela dama, soube que me queríeis entrevistar. Aqui me tendes.” Deixei-o entrar e comecei a entrevista.

Boa tarde. Fico feliz por tê-lo aqui, finalmente. Já não tinha esperança de que a nossa entrevista pudesse vir a acontecer...
Vós, Senhora, tudo tendes, senão que tendes os olhos verdes.

É de conhecimento público a sua admiração pela figura feminina. Como está a sua vida amorosa neste momento?
Aquela cativa, que me tem cativo, porque nela vivo já não quer que viva.

Como é ela? 

Rosto singular, olhos sossegados, pretos e cansados, mas não de matar.

Qual foi a coisa mais romântica que já lhe disse?
“Pede o desejo, Dama, que vos veja”.

Como é sentir-se apaixonado?
É querer estar preso por vontade; é servir a quem vence o vencedor; é ter com quem nos mata, lealdade.

E o Amor? O que é para si o Amor?
Amor é um fogo que arde sem se ver, é ferida que dói e não se sente; é um contentamento descontente, é dor que desatina sem doer.

Como seria o seu lugar paradisíaco?
Alegres campos, verdes arvoredos, claras e frescas águas de cristal. O céu, a terra, o vento sossegado... As ondas, que se estendem pela areia... Os peixes, que no mar o sono enfreia... O noturno silêncio repousado...

Quando é que se apercebeu do seu gosto pela poesia?
Foi naquela triste e leda madrugada, cheia toda de mágoa e de piedade.

O que acha de se celebrar o dia 10 de junho em sua honra?
Enquanto houver no mundo saudade quero que seja sempre celebrado.

Qual foi o principal motivo para os seus desterros?
Erros meus, má fortuna, amor ardente...

Onde viveu durante a maior parte da sua infância?
Junto de um seco, fero e estéril monte, inútil e despido, calvo, informe, da natureza em tudo aborrecido, onde nem ave voa, ou fera dorme, nem rio claro corre, ou ferve fonte, nem verde ramo faz doce ruído.

O que acha dos tempos atuais?
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, muda-se o ser, muda-se a confiança; todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades.

Como resumiria a sua vida?
Erros meus, má fortuna, amor ardente...

Obrigada pela sua disponibilidade. Espero voltar a vê-lo um dia. 

E foi assim que acabou a nossa entrevista. Depois da minha última frase, e antes que Luís de Camões pudesse dar-me qualquer resposta, acordei. Levantei-me e apontei toda a entrevista num caderno que tinha aberto em cima da minha secretária.

Mariana Pereira Paulo, 10º D

6 de junho de 2017

O Casamento: Uma cerimónia “espantante”!

Mais uma crónica de mão-cheia do Alexandre!
Pintura de Marc Chagall, 1939
Calmamente, e com cautela para não ser notado, faço uns rabiscos na toalha de papel que cobre a mesa onde me encontro. Uma das muitas mesas redondas que, estrategicamente posicionadas, preenchem a sala. Nestes dias, todas as pessoas deixam de parte os conflitos pessoais, vestem as suas melhores roupas, e o Amor, esse que matou Inês de Castro, a que "depois de morta foi rainha", paira no ar.

Encontro-me, obviamente, num casamento. É uma cerimónia que me provoca sempre um misto de emoções... Para começar, constrangimento. O momento da chegada ao local da cerimónia é o que anseio que mais rapidamente passe. Pessoas que descubro serem da minha família, mas que me conhecem como se convivessem comigo diariamente, exageram ao dizer: "Ah, olhem para ele! Já está mais alto do que a mãe!". E eu só penso: "Como se fosse difícil. Até um anão que pudesse viver no Portugal dos Pequeninos é quase do tamanho da mãe.". Enfim. Enchem-me a cara de batom vermelho-vivo, mancham a minha camisa branca com base e esmagam-me dentro dos seus largos braços. Refiro-me, claramente, às "indivíduas" do sexo feminino. Com os homens, o cenário é extremamente diferente. Apertamos a mão, sorrimos, e perguntamos como tem corrido a vida. Muito mais simples, limpo e confortável, acreditem.

Em segundo lugar, esta cerimónia motiva também o crescimento de um sentimento de comoção dentro de mim, dentro dos outros convidados, dentro de todos, mesmo dos que estão a ver os noivos pela primeira vez. Há sempre três razões para se estar presente num casamento: ser-se convidado por gosto, por obrigação ou mesmo nem se ser. Aparecer, comer, beber, rir, e voltar para casa. A noiva pensa “deve ser da família do meu querido noivo”, e o noivo pensa “deve ser da família da minha querida noiva”, portanto, ninguém se insurge contra aquela presença estranha. A comida, que aos noivos parece sempre pouca, mas que serve de alimentação nas duas semanas seguintes, acabaria também por se estragar. Voltando ao que interessa. Até nós, homens, que muitos acusam de carregarmos um coração de pedra, nos comovemos em alguns momentos. Quando a noiva entra, ao som da mais bela das melodias, exibindo o seu longo vestido pela Igreja adentro, ou mesmo quando os noivos prometem nunca se separarem, na saúde e na doença, na alegria ou na tristeza, são momentos que não nos passam despercebidos. Reagimos de forma diferente, pois sabemos como nos conter e impedir algumas lágrimas de nos correrem pela face abaixo, apenas isso.

Um facto curioso… Em 2016, estimou-se que em cada cem casamentos, setenta terminassem com um pedido de divórcio. Imaginemos que, em média, cada casamento tenha um total de cem convidados, contando com os noivos. Têm sempre muito mais, se contarmos com os que se auto-convidam, como já citei, mas esses não vão entrar nos meus cálculos. Cada um dos convidados compra uma nova roupa para estrear no casamento, e a cada um deles são servidas cinco refeições, no dia da cerimónia. Ou seja, se um casamento terminar em divórcio, cem novas roupas foram estreadas em vão e quinhentas refeições foram servidas desnecessariamente. Contudo, no dia importante, ninguém pensa que os noivos, dias mais tarde, em vez de subirem à mesa para se beijarem apaixonadamente, quando os convidados espancam violentamente os pratos, subirão antes os seus tons de voz, para se tentarem sobrepor numa acesa discussão.

Algo me intriga, nisto dos casamentos: à medida que o dia avança, as mulheres vão ficando cada vez mais pequenas. Até a minha mãe me pedir, aflitíssima, que fosse ao carro buscar os seus sapatos rasos, nunca tinha percebido este estranho fenómeno da diminuição da altura feminina ao longo do dia!

Antes de se chegar ao casamento, normalmente, os dois seres apaixonados conhecem-se, namoram e acabam por ficar noivos. Enalteço o advérbio “normalmente”, pois há sempre casos em que a conta bancária de um dos noivos se sobrepõe às duas últimas etapas que antecedem o casamento, já por mim mencionadas.

Noutros tempos, todas as raparigas eram uma espécie de Efire, "fugindo" dos seus pretendentes como esta ninfa tinha fugido de Leonardo, pobre e azarado nauta. Agora, são todas como as restantes ninfas...Atiram-se a quem têm debaixo de olho, sem pensar duas vezes. No meu entender, os papéis têm-se invertido. De momento, em vez de serem os "Leonardos" a correrem atrás das "Efires", são as "Efires" que perseguem ferozmente os "Leonardos". Nunca imaginou Camões que a sociedade tanto se fosse transformar, quando escreveu a obra que marca eternamente a nossa língua. 

Soube ontem que os noivos do último casamento ao qual fui não tinham estado juntos mais de um mês. É "espantante", como exclama sempre o meu irmão mais novo. E acho que a palavra "espantante" devia ser mesmo incluída no dicionário, para poder descrever este tipo de situações. São, deveras, "espantantes". O ser humano, refletindo, é algo "espantante". Consegue que o céu não seja o limite, e, ao mesmo tempo, limita tudo o que é seu. Uma felicidade que é jurada como sendo eterna é limitada por uma série de rixas sem fundamento. Foi o caso deste casal, que esteve casado alguns dias. Depois de vários meses a preparar a cerimónia, a procurar uma casa, a tentar comprar um carro, segue cada um o seu caminho, esquecendo todos os abraços, todos os bons momentos e todas as vezes que tiveram uma grande probabilidade de serem contagiados com sífilis ou mononucleose, doenças que se transmitem no ato do beijo.

Seguem-se meses cheios de problemas. Visitas ao registo civil para anular o que uns dias antes validaram, problemas com as partilhas, desentendimentos de ordem ideológica frequentes. Se eu fosse juiz, chamava algum representante da Igreja ao Tribunal para termos uma conversa séria. Em vez de os noivos prometerem nunca se separarem, nem na saúde, nem na doença, nem na alegria, nem na tristeza, deviam prometer estarem casados, pelo menos, durante dois meses, para que depois não se acumulassem casos de divórcios nos tribunais, que levam meses ou anos a resolver.

Acho que, por hoje, não consigo escrever mais. O atenuante barulho dos talheres a embater nos pratos, copos ou qualquer coisa que faça com que os noivos se levantem e se beijem ainda corrói a minha cabeça. Esta é uma das perguntas que me coloco sempre que venho a este tipo de eventos...De que material serão feitos os inúmeros talheres e copos que ornamentam as mesas? É que são constantemente, casamento após casamento, esmurrados e torturados como se de sacos de boxe se tratassem, e nunca vi nenhum prato ou copo partido...Por outro lado, em casa, quando arrumo a louça, excecionalmente, para agradar à minha mãe, é impossível terminar a minha tarefa sem partir alguma peça. Ela acaba sempre por notar que arrumei a louça, não por estar bem arrumada, mas sim por haver menos do que havia antes. 

Das poucas coisas que me agradam nos casamentos, destaco este tipo de toalhas sobre a qual escrevi já quase metade da mesa. Enquanto todos vão “dançando” (considere-se este conceito a ação de abanar sem nexo o maior número de membros possível ao mesmo tempo), faço que as minhas palavras dancem, de uma forma muito mais subtil, espero, ao longo deste circular pedaço de papel. Quando a noite chegar ao fim, um empregado, que mesmo tendo passado o dia a servir às mesas terá a sua camisa branca mais limpa do que a minha (vantagens de se ser empregado e não convidado, diga-se de passagem), arrancará, sem emoção, esta toalha que me serviu de computador durante alguns minutos. Prefiro escrever à mão, pois sinto-me eu. Tenho total controlo sobre o que escrevo. Ao escrever no computador, sinto-me mais os outros. E sinto que não controlo o computador, e que é ele que me controla. Odeio computadores. 

No entanto, há uma semelhança entre mim e os computadores. Não temos namorada. Mais depressa verei um computador a namoriscar com uma máquina fotográfica do que eu com alguma rapariga. E sabem que mais? Também não me importo! Pelo menos, não me caso. Nem me divorcio. É que, ainda mais do que computadores, odeio casamentos. 

Alexandre Martins, 9ºA

24 de maio de 2017

Poesia visual 2

Mais trabalhos do 7º A, em que o grafismo e as palavras se entrelaçam e constroem outros sentidos.






16 de maio de 2017

Poesia visual

Temos um especial prazer em divulgar aqui as experiências criativas dos alunos do 7º A. Ora vejam se não merecem! Começamos com dois poemas.






4 de abril de 2017

Pode ser?

Paul Klee, Flora on sand, 1927
Pode ser, digo eu
Pode ser sim.
E porque não?

Porque me perguntam,
Se respondo sempre: Pode ser?

E o que pode ser?
Neste mundo o que pode ser?
O que se pode ter?
Se o mundo nos dá o céu, o mar e a terra também?

Vamos nós também dar um pouco de nós,
Pode ser?
Vamos deixar cada qual a sua marca,
Marcar a diferença, sonhar, lutar, concretizar,
E fazer um mundo melhor.

Pode ser?


                           Rafael Sousa, 12.º B

16 de março de 2017

Um Herói

O Duarte Afonso traz-nos uma reflexão acerca de heróis, ídolos, celebridades. Será tudo a mesma coisa?


Um herói é muito mais do que um ídolo. Um herói supõe, a meu ver, que faça algo grandioso pela sociedade ou que, de alguma forma, contribua para o desenvolvimento da história mundial.

Primeiramente, gostava de referir que eu, como qualquer pessoa, tenho ídolos, referências. Fico bastante feliz quando vejo o “nosso” Ronaldo a marcar um golo ou a ganhar um prémio, da mesma forma que acho graça quando ouço o cómico Ricardo Araújo Pereira a falar nas manhãs da Comercial. Fico simplesmente contente, e isso é algo saudável. É bom termos exemplos a seguir, mas que não ultrapassem os limites.

Em segundo lugar, é notório que as novas tecnologias contribuem para o surgimento de celebridades, que facilmente se transformam em ídolos. Porém, há sempre aquelas pessoas que seguem os seus ídolos cegamente. Por exemplo, se num dia uma celebridade disser algo que soe bem ao ouvido, muitas serão as pessoas que, contagiadas, dirão essa mesma expressão, sem saber porque o estão a fazer.

Por último, creio que esta ideia também não é completamente válida, ou seja, um herói não é necessariamente um ídolo, pois muitos foram os heróis que não tiveram o devido reconhecimento.

Em suma, a noção de herói é diferente da de ídolo. É bom que todos tenham referências, mas que as sigam de forma saudável.

Duarte Afonso, 9ºB

1 de março de 2017

Heróis versus heróis

Um interessante texto do José Tobio, que avalia o mundo contemporâneo com espírito  crítico.

Fama (Dresden)
Na era dos Descobrimentos havia muitos heróis. Gente na esperança de encontrar ilhas ou terras, gente que olhava para a morte e se ria. Agora há quem chame herói a alguém que só faz figura de parvo!

É verdade que ainda existem heróis na nossa sociedade, mas comparados com os do passado são praticamente nada. Pessoas como Neil Armstrong, Usain Bolt ou Stephen Hawking são heróis, pois fizeram ou fazem coisas extraordinárias, dignas de memória, embora, provavelmente, não sejam comparadas às dos heróis do passado. Mas alteraram, cada um na sua área, o mundo. 

Há quem considere pessoas como o Cristiano Ronaldo ou o Justin Bieber heróis, uns entendo, outros não! Dizer que este é "o meu herói" porque lançou uma música “fixe” ou porque fez um vídeo popular no “youtube” não é estranho, é, no mínimo, absurdo!

Hoje, qualquer pessoa que seja considerada celebridade é um herói. Até podem ser racistas, homofóbicas, mas vai haver sempre alguém a dizer que quer ser como ele. Vá-se lá perceber! 

Comparo a minha geração a um íman, porque se algo ficar popular, nós vamos pegar-nos a isso e vamos vê-lo, ouvi-lo ou fazê-lo vezes sem conta!

Acredito que atualmente ainda existem heróis. Contudo, a sensação que tenho é que os que fazem coisas engraçadas ou os que fazem figura de parvos são mais facilmente lembrados. Felizmente, e alegra-me pensar assim, não como os que Camões define como aqueles que “se vão da lei da morte libertando”, pois “os parvos” serão tão breves como um fósforo, cuja chama é efémera.

José Tobio, 9B

25 de fevereiro de 2017

A propósito das obras e autores que vamos estudando

Maria Helena Vieira da Silva, Biblioteca
Que temos grandes escritores - tantas vezes lidos a contragosto pelos nossos alunos - sabemos bem que sim. E quando, rompendo a barreira da hegemonia cultural anglo-saxónica, chegam ao estrangeiro, o deslumbramento que despertam deveria tornar-nos a todos, se outras razões não houvesse, mais disponíveis a lê-los, a ser-lhes gratos e a não permitir que caíssem no esquecimento. 

Ora vejamos estes excertos de uma entrevista de Eugénio Lisboa, um dos nossos melhores ensaístas, acerca disto mesmo:

«[No mundo lusófono ainda] não temos força económica para nos tornarmos apetecíveis. Mesmo assim é impressionante as vias que temos aberto. Nomes como o Fernando Pessoa... embora a meu ver seja conhecido não da maneira adequada, mas é conhecido. 

O Eça de Queirós... Quando estive em Londres fiz uma reedição d’Os Maias e a crítica inglesa postou-se de cócoras perante a grandeza do livro. Simplesmente, são grandes clássicos que impressionam o mercado durante um determinado período e depois eles esquecem-se deles. Tem de se voltar a acordá-los daí a 20 ou 30 anos. A primeira vez que Os Maias abriram brechas no imaginário anglo-saxónico foi, salvo erro, em 1965, quando foram traduzidos pela primeira vez, e o livro esteve na lista de bestsellers da Time Magazine durante semanas e semanas. Os fulanos diziam que para se encontrar universos comparáveis é preciso recorrer a Stendhal e Tolstói. Mas passados dois, três anos esquecem-se.

(...) Quando "A Ilustre Casa de Ramires" [romance de Eça] foi reeditado, o crítico literário Jonathan Keats, no Observer, salvo erro, perdeu literalmente a cabeça com o livro. Ele dizia que se o Flaubert precisasse de matar a mãe para escrever um livro como aquele, o faria.»
Eugénio Lisboa em entrevista a Diogo Vaz Pinto, publicada no Jornal I em 25/02/2017

21 de fevereiro de 2017

A MIM

Fernando Pessoa continua a interpelar os jovens leitores da nossa escola, como nos mostra este poema do Rafael.

Paul Klee (1916)


Ai que rima faço eu mal
Por rimar sem rimar!
Se alguém que por natural rimasse
A mim me deixasse embalar…
E ainda há quem diga
que a rimar se pinta a vida.

Nem pincel nem cordel,
Nem coisa alguma que seja,
Senão sempre o mesmo Norte,
Mas sem força guerreira que aponte
Esse Norte para cima,
Só a força humana,
Só o caminho da vida,
E num piscar de olhos –
Sul!

Ai! Que coisa!
Vontade Humana?
Ai! Que coisa!
Que tempos vivo, feliz,
E ser hoje feliz
É ter sido ontem esmagado.
E o ontem sendo um hoje
Queria eu não tê-lo feito.
Estúpida vontade humana,
Pensar que sabe onde é o Norte.

Alberto Caeiro rimava sem rimar
E eu sem rimar rimo.
Sei lá que figura de estilo,
Eu uso o que costumo:

Nem métrica nem versismo,
Neologismos e o que esteja a pensar.
Meio Caeiro meio vinte e um, (sismo!)
Que de tremer, este século
Me está a desnortear.

Ah! Porque escrevo nem eu sei
O que escrevo só eu sei.
Poder ser poeta e fingir
E fazer alguém sentir que fingiu.
Mas sou um reles inventor.

Nem mitologias gregas,
Como dos outros de que ele se fingiu,
Nem rima com rima,
Nem rima sem rimar.

E depois,
Perdido na modernidade, olho.
O que mudou?

Lembra-te da cena de amanhã,
Imagina, (perspetiva), a cena de ontem.
(Que mundo?)
(Que Norte?)

A cada guinada sinto,
Sinto o vento que passa,
E vejo na rua o novo
(eis, mais).

Também que queríeis, oh?
Sempre o mesmo?

A andar ou a correr
Todos lá iremos ter.
Lá isso é verdade,
E não há quem negue o facto.

Tu que estás aí esparramado
Levanta-te, que não és farrapo,
Mexe-te, faz-te à vida.
Mas não mandes no Norte!
Nem tão pouco na Sorte,
Nem no Mundo,
Nem no natural,
Nem no abstrato,
Nem no mais pormenorizado retrato,
De ti.

Arte é não saber onde fica o Norte
E nunca estar desnorteado.

Não dê eu tudo por perdido,
Por poeta não ser,
Mas um coração ter
Que te acompanhe

Nessa tua vidinha…

Rafael Sousa, 12º B

8 de fevereiro de 2017

DES(ACORDO) ORTOGRÁFICO

Alguns anos volvidos sobre o início da aplicação do Acordo Ortográfico em Portugal, são incontáveis as instituições, inclusive públicas, as editoras, as publicações, os escritores e os cidadãos que perseveram na recusa do AO, não encontrando justificação, nem linguística nem no que à política da língua diz respeito, que o recomende. As ambiguidades que originou, o surgimento de palavras irreconhecíveis, o afastamento abrupto da etimologia, bem como o proliferar de erros ortográficos antes desconhecidos, tudo tem levado a protestos constantes. 

Chegou a vez de a Academia das Ciências de Lisboa, que é o órgão consultivo do Governo português em matéria linguística, apresentar as suas reservas face ao resultado desta tentativa de uniformização ortográfica. E propor, através do Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Língua Portuguesa,  um aperfeiçoamento do Acordo, que "aprimore" as novas regras ortográficas. Em vão, ao que parece.
O documento, chamado SUGESTÕES PARA O APERFEIÇOAMENTO DO ACORDO ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA, pode ser consultado aqui.

7 de fevereiro de 2017

NOVA POESIA TROVADORESCA #2

Parodiando a poesia dos trovadores.

Representação medieval de uma alfaiataria
Se eu pudesse comprar
Um casaco que me chamou,
Era um bocado caro de se pagar
Mas o coração me tirou!
Assim aconteceu,
       Mas se o pudesse comprar
       Não precisava de andar sandeu.

Mas não o posso comprar
Porque espaço no roupeiro não sobrou,
Tanto isto me faz sonhar
Que já nem sei para onde vou!
Muito triste fiquei eu,
       Portanto se não o comprar
       Hei-de andar sandeu.

Mas rezo a Deus que me possa ajudar
Já que o lindo casaco não ajudou,
 Talvez se o comprar,
Aconteça um milagre, tal como se rogou!
E que mal que me deu,
       Pois se o pudesse comprar
       Não precisava de andar sandeu.

João Lourenço   10º D

29 de janeiro de 2017

ODE AOS ORGULHOSOS EM SI PRÓPRIOS

Picabia, 1912
Liberdade de ser eu
Ai tão bom a liberdade de poder ser eu!
Não quero ser mais ninguém,
Por mais posses e dinheiro que possa ter,
Por mais beleza e saúde que possa ter,
Por mais tanta coisa que toda a gente inveja!
Não quero ser mais ninguém
Toda a gente já é alguém 
E como eu não há ninguém 
E eu posso ser eu 
E tenho liberdade de o ser
Então porque não hei-de sê-lo?

Tenho tanto amor àqueles que são eles,

Tanto amor que chega a ser doentio.
Tenho amor àqueles que não têm medo,
Não têm vergonha,
Não temem nada em serem eles próprios!
Amo obsessivamente homossexuais assumidos,
Amo obsessivamente mulheres que lutam pelos seus direitos, 
Amo-me obsessivamente por me ter descoberto e não ter vergonha 
Não ter vergonha do que sou e do que escrevo!
Amo obsessivamente quem não se cansa de gritar,
De gritar o que ama, 
De gritar o que o move,
De gritar o que sente!
Tudo isto é o que faz o meu coração palpitar,
O sangue correr-me nas veias,
Os meus pés caminharem
E espezinharem o preconceito
E o medo de ser quem somos!

AI! O respeito, 

O respeito pelos outros, 
O respeito por aqueles que não são iguais a mim 
E não têm vergonha de não serem!
Ai! Dou a minha vida pelo respeito,
Dou a minha vida por um mundo com tanto respeito quanto eu 
Tenho por esses,
Muitas vezes chamados de tolos
Que para mim são heróis,
Esses, que são verdadeiros a eles próprios! 

E agradeço a minha existência,

A minha vida,
O eu que hoje sou,
A quem não tem medo de ser
E não apenas existir!

               Lícia Fialho, 12ºE