Mostrar mensagens com a etiqueta metas-curriculares. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta metas-curriculares. Mostrar todas as mensagens

27 de novembro de 2012

Metas curriculares

Segundo pode ler-se na Introdução ao documento que define as Metas Curriculares para o Ensino Básico, elas assumem este ano um caráter indicativo, tornando-se obrigatório o seu seguimento, em articulação com o processo de avaliação, em 2013/2014. Importa pois refletir acerca deste referencial que norteará o nosso trabalho a partir do próximo ano letivo. 
 

Segue-se uma opinião abalizada, publicada na sua página do Facebook pelo Professor Carlos Ceia, (da FCSH da Universidade Nova de Lisboa), o qual desde há muito acompanha as questões da formação inicial de professores.
«Depois de ter criticado severamente o anterior modelo de metas de aprendizagem, onde o menosprezo institucionalizado pelo conhecimento científico em favor de uma falsa pragmática era a nota dominante, tenho agora que felicitar a equipa da Professora Helena Buescu por ter sido capaz de criar um documento legível e proveitoso para a organização do ensino. Onde tínhamos o elogio do treino de competências relacionadas com uma textualidade meramente linguística, temos agora uma educação dirigida ao conhecimento do texto enquanto estrutura dinâmica e criativa de sentidos que tanto podemos encontrar nas suas modalidades literárias como nas não literárias.
As diversas equipas das metas de aprendizagem trabalharam seguindo as suas convicções idiossincráticas sobre o que deve ser ensinado e aprendido e não houve uma articulação entre os diversos saberes nem sequer os que estão mais próximos uns dos outros. A formação literária estava dissimulada no ensino de línguas estrangeiras em todo o Ensino Básico. Não havia um pensamento transversal, não havia sequer uma estratégia geral de promoção do ensino da literatura nos diversos níveis de ensino. A formação do gosto literário e/ou a formação de novos leitores continuava à mercê da imaginação romântica de cada professor e da sua sensibilidade para integrar o ensino avulso da literatura nos rígidos programas de ensino do novo pragmatismo da língua materna.
Mantenho a reserva de opinião sobre a questão complexa de termos metas por anos escolares ou por ciclos. No sistema inglês, as metas (ou attainment targets) não se organizam por anos de escolaridade, porque, por exemplo, é possível um estudante do 6º ano ler e escrever melhor do que um do 9º ano. No sistema português comete-se, desde há muito, este erro estratégico de confundir metas de aprendizagem/curriculares (para ciclos de aprendizagem) com organização curricular anual (para a gestão da escola, da vida escolar e da acção dos professores).
Não era só a palavra literatura que estava ausente das metas de aprendizagem. Também faltava a palavra-chave autoconhecimento. Estarão erradas todas as metas de aprendizagem/curriculares da leitura literária que nos afastem do conhecimento de nós mesmos. Essa meta é a mais difícil de ensinar, mas ao mesmo tempo a mais profícua. Ninguém se forma como leitor se não tiver como objectivo maior nessa função o autoconhecimento, que é aquilo que nos individualiza verdadeiramente e aquilo que define a nossa identidade. Aprender a ler e a escrever bem através da literatura é um caminho único para a formação pessoal que não se faz apenas por via de um conjunto de competências pré-determinadas que importa treinar. O fragmento 229 do Livro do Desassossego de Bernardo Soares contém uma lição importante sobre o significado da leitura e o modo como a podemos executar: “Ler é sonhar pela mão de outrem. Ler mal e por alto é libertarmo-nos da mão que nos conduz. A superficialidade na erudição é o melhor modo de ler bem e ser profundo.” O caminho apontado pelas anteriores metas de aprendizagem, para a Língua Portuguesa, ilustrava a metodologia inversa da complexidade na erudição e esse seria sempre o pior modo de ler bem, nunca ser profundo e, assim, nunca chegar a conhecer bem quem somos.
O novo documento promove uma "educação literária", não tem medo de a assumir e isso é já por si uma revolução que importa aplaudir.»