25 de dezembro de 2022

Natal de 44

Miró, Postal de Natal

Em miúdo alegrava-se-me o rosto
quando chegava a festa do Natal.
Toda a noite trabalhava a peneira
e de manhã vestiam-me a roupa bonita.

Então escapava-me de casa a correr
e andava na praça a mostrar-me;
e ao meio-dia em ponto na mesa enfeitada
comíamos todos em santa paz.

Oh, o meu Natal, o cheiro dos doces,
hoje passei-o às voltas numa estrada,
sem um pedaço de pão, a roupa emprestada,
longe de casa e sem amor de ninguém.

Tonino Guerra, traduzido por Nuno Dempster, a partir do Romagnolo

21 de dezembro de 2022

BOAS FESTAS

Bem-aventurados os que promovem a paz, pois serão chamados filhos de Deus.

                                                                                                     Mateus, 5:9

Pintura de Nabil Anani, Palestina, Família de Belém,1925.

 

18 de dezembro de 2022

DOS DEVERES E OBRIGAÇÕES DE TODOS NÓS

 

No discurso que proferiu quando recebeu o prémio Nobel da Literatura, em 1998, José Saramago falou do seu desejo de fazer do mundo um lugar melhor, e da necessidade de firmarmos um conjunto de deveres éticos que todos os seres humanos deveriam respeitar. Deveres e obrigações que tomaram forma numa carta redigida por um grupo de trabalho da Universidade Autónoma do México.

O documento, inspirado no discurso de Saramago, foi elaborado por intelectuais e académicos de várias áreas e disciplinas, e incide na responsabilidade social e individual, associada aos direitos consignados na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Estes são os principais pontos desta notável Carta dos Deveres e Obrigações do Homem, que a todos deveria obrigar-nos, no nosso anseio por um mundo melhor:
  • Obrigação de erradicar a fome e de não desperdiçar comida.
  • Obrigação de erradicar o analfabetismo e de oferecer educação de qualidade.
  • Obrigação de partilhar o conhecimento técnico e a perícia, para promover a saúde integral.
  • Obrigação de comportamento rigoroso e respeitoso, ao exercer a liberdade de expressão.
  • Obrigação de utilizar com eficiência a energia e as medidas destinadas à poupança energética
  • Obrigação de eliminar a desigualdade extrema nas sociedades e de propiciar a igualdade social.
  • Obrigação de hospitalidade para com emigrantes e refugiados.
  • Obrigação de dirigir o conhecimento científico para a preservação da vida.
  • Obrigação de respeitar o meio ambiente e de contribuir para a sua limpeza, manutenção e regeneração
  • Obrigação de respeitar o habitat e a forma de vida dos animais não humanos.
Informação recolhida em:
http://verne.elpais.com/verne/2015/10/17/articulo/1445091220_052404.html

12 de dezembro de 2022

Relativismos

 Para sorrir, que também é preciso, embora o assunto da sátira seja sério. Ora vamos lá pensar!

Cartoon sem autoria atribuída, assim encontrado na internet

 

7 de dezembro de 2022

CHAMO-ME ART E TENHO 90 ANOS

Da Ana Lourenço: escrever pondo-se no lugar do outro - duplamente, como num jogo de espelhos. Bem interessante.  

 


Mais uma tarde chuvosa de janeiro! Vou ficar na janela do meu segundo andar, a olhar quem passa. Nesta cidade, anda-se de carrossel.

Um jovem, creio que de vinte e poucos anos, protagonista da sua vida, anda de um lado para o outro, perdido. Parece perdido. Do que precisará ele? Orientação? Ajuda, um conselho amigo?

Observo-o cada vez mais curioso, dou comigo a pensar “será que vai fazer-se ao caminho ou ficar ali naquela chuva?”

De repente, revejo-me com aquela idade, de barbas bem tratadas, um pouco mais corcunda, mas nunca me faltou a postura, coisa que se foi perdendo com o tempo. Era um homem bonito!

Ele parecia inquieto a olhar para o telefone, assim como todos os outros como ele, que ali passam. Surpreendo-me que deste andar ainda consiga ver bem, da mesma maneira ou melhor do que quando tinha a sua idade. Talvez ele precise, depois de ouvir, ver. Se for esse o caso, chego-me à sua beira “Chamo-me Art e tenho 79 anos, visão apurada que me oferece um bom sentido de orientação, estás perdido, amigo?”.

Talvez ele apenas precise de fazer aquilo que recusei na sua idade: ouvir quem me dava as direções.

Ana Lourenço 12º D

23 de novembro de 2022

OS NOSSOS POETAS

A Angélica Lourenço partilha connosco um poema a pedir leitura atenta, que aceite acompanhar este convite à indagação de si. Muito bem, Angélica!

Pintura de Ton Dubbeldam, Water Garden

PASSAGEIRO

É água que escorre pelos dedos.
É uma faca de dois bicos,
Tanto movimenta, como estabiliza,
Tanto gera, como desola,
Tanto massacra, como cura.

Se o instante que está por vir é o futuro,
E o instante que passou é o passado,
Então o presente é um ápice… uma ilusão?

Criámos o relógio para controlar o tempo,
Mas é o tempo quem nos controla.
Corremos contra os ponteiros,
Aspiramos a eternidade na efemeridade.

O tempo está a terminar?
Não! Ainda falta… a primavera mal começou!
Será que falta?
Acredito que sim…
Quero acreditar que as flores estão a desabrochar,
Quero acreditar que os pássaros estão a cantar.

Mas sinto um ar gélido,
Que se entranhou e me arrepia.
Vejo folhas secas, folhas caídas.

Assim que pisei o mundo
A minha contagem regressiva começou,
Desconheço quanto tempo me resta,
Ninguém me diz, ninguém sabe...
Porque haveriam de saber?

O desconhecido é intimidante,
Devo viver na suave ignorância
Ou na dolorosa consciência?

Uma coisa eu sei!
Nada posso fazer senão continuar.
O tempo é passageiro, é finitude,
Velhos sábios ou jovens ousados,
Ambas as histórias terão um ponto final
E eu nada posso fazer
Senão continuar esta caminhada,
A caminhada de um mero passageiro.

Angélica Lourenço, 12º D

31 de maio de 2022

ASSIM QUIS O DESTINO

Integrado no projeto DAC que o 10º D/E desenvolveu este ano, um outro poema do Martim, desta vez de temática inesiana.

 

Giovanni Prini, Os Amantes, 1913

Reinava Afonso IV
No reino de Portugal
Nunca ninguém pensou
Que a história acabasse mal

D. Pedro, jovem príncipe
Gago e inteligente,
Apaixonou-se por Inês
Uma jovem sorridente

Um amor inesperado
Que tanta lágrima derramou
Assim estava destinado  
Para acabar como acabou

Triste história de vida  
Sofrimento e solidão  
Triste destino traçado  
Que lhe feriu o coração
 
Pedro era casado com Constança
Um casamento com fim traçado
Pois D. Pedro, el-Rei “Cruel”,
Por Inês andava enamorado

Nunca pode ele prever
Que seu pai a mandasse matar
Ali encontrou Inês
Deitada sem respirar

Malditos homens cruéis
Com ganância e frieza aos molhos
Mataram Inês de Castro  
E D. Pedro lhe fechou os olhos

D. Pedro jurou a seu pai
Que nunca se vingaria
Mas depois da sua morte
A promessa não cumpriria

Muito chorou D. Pedro
Tanto sofreu por amor
Assim quis o destino
Destino que lhe trouxe dor 

 

Martim Carvalho, 10º D

08/04/2022

22 de maio de 2022

DESAMORES

 Do Martim Carvalho, 10.ºD, um poema que diria inspirado nas rimas de Camões. 

Rosas,  1871, Henri Fantin-Latour

Não são rosas
Não são flores
Nem são pétalas
São desamores

São espinhos negros
Que picam meu leve peito
Não são aroma cruel
Sobre o qual me deito

Não tem cor
Tem pouca sorte
Não conhece amor
E espera pela morte

Morte que dói
E que acompanha a vida
Quão triste será
Acabar de alma perdida

Tanta dor que acarretas
E que não deixas ir embora
Assim que chegas mais perto
Vemos que já está na hora

Não é paixão nem amor
É só dor e sofrimento
Não é alegria nem sorrisos
É uma espera pelo tempo

Tanto tempo esperamos
Com medo de a morte chegar
Mas a morte é inofensiva
E a mim não me vai assustar

Martim Carvalho, 10º D

(27/04/2022)


25 de abril de 2022

25 de Abril

Steven Jones, pintor inglês contemporâneo

MANHÃ FUTURA

Era preciso agradecer às flores
Terem guardado em si,
Límpida e pura,
Aquela promessa antiga
Duma manhã futura.

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN

20 de abril de 2022

ALCOBAÇA, A CASA DE INÊS E PEDRO


O mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, monumento fundador do gótico cisterciense em Portugal, começou a ser construído no século XII, depois da vitória de D. Afonso Henriques em Santarém. A igreja da Abadia segue o modelo de Pontigny, em França: uma arquitetura de rigor aplicada à imponente nave central, com mais de cem  metros de comprimento. O deambulatório, por onde os monges caminhavam em oração, é sustentado por arcobotantes, os primeiros em território português. Na ornamentação da Capela de S. Bernardo, os barristas de Alcobaça criaram uma das suas mais expressivas obras, modelando as estátuas em terracota. E depois há as cozinhas e as soluções engenhosas  para levar água a um espaço amplo, com preocupações de higiene.

Nos seis séculos seguintes, o espaço será acrescentado ou remodelado,  de acordo com os novos movimentos arquitetónicos e com a necessidade de cada monarca deixar a sua marca real.

Na história deste mosteiro há também uma vocação para o ensino; no século XVII chega a ser a mais importante escola monástica do reino. Mas já antes eram ali preparados os noviços, e os monges  copiavam manuscritos. 

Neste documentário que vos convidamos a ver, o historiador Rui Rasquilho apresenta-nos o monumento que está ligado ao início da monarquia portuguesa e onde estão guardados os mais belos túmulos da escultura funerária gótica, túmulos onde repousam  os imortais amantes, D. Pedro e D. Inês.

(texto adaptado de https://ensina.rtp.pt/artigo/patrimonio-mundial-portugues-mosteiro-de-alcobaca/)

17 de abril de 2022

EM DOMINGO DE PÁSCOA


                               Vivaldi: Gloria - Gloria in excelsis Deo

10 de abril de 2022

Domingo de Ramos

 Para assinalar o Domingo de Ramos, festa litúrgica do calendário cristão, partilhamos aqui uma das obras mais enigmáticas da coleção de pintura do Museu Nacional de Arte Antiga - um ícone da escola eslava, pintura sobre madeira, provavelmente do século XVIII: “Entrada triunfal de Jesus Cristo em Jerusalém”.

 


 


7 de abril de 2022

A Família Humana

 Um poema de Maya Angelou, escritora e ativista dos direitos humanos norte-americana, mulher de mil ofícios e vicissitudes, a lembrar-nos a nossa comum humanidade - e que é mais aquilo que nos une do que aquilo que nos separa, meus amigos.

 

Bem vejo as óbvias diferenças
que há na família humana.
Alguns são sérios,
outros florescem no riso.

Alguns declaram que as suas vidas
decorrem em real profundidade,
enquanto outros alegam que vivem
na real realidade.

A variedade dos nossos tons de pele
pode confundir, divertir, deleitar,
castanho e rosa e bege e púrpura
e bronze e azul e branco.

Cruzei os sete mares
e desembarquei em todas as terras.
Vi as maravilhas do mundo,
mas nenhum homem comum.

Conheci centenas de mulheres
chamadas Jane ou Mary Jane,
mas nunca vi duas
que fossem realmente iguais.

Gémeos idênticos são diferentes,
embora as suas características combinem,
e os amantes têm pensamentos bem diversos,
enquanto deitados lado a lado.

Amamos e perdemos na China,
choramos nos pântanos da Inglaterra,
rimos e gememos na Guiné,
prosperamos em terras espanholas.

Buscamos o sucesso na Finlândia,
nascemos e morremos no Maine.
Nos pequenos detalhes somos diferentes,
no que importa – somos iguais.

Noto as diferenças óbvias
entre cada género e tipo,
mas nós somos mais iguais, meus amigos,
do que diferentes.

Somos mais iguais, meus amigos,
do que diferentes.
Somos mais iguais, meus amigos,
do que diferentes.


Maya Angelou (tradução de fonte desconhecida)

 

 

16 de março de 2022

ODE À PAZ

«Eu te conjuro ó paz, eu te invoco ó benigna»

Evocamos as palavras de Natália Correia, que morreu a 16 de março, cumprem-se hoje 29 anos. Evocamos a mulher lúcida e determinada, divulgando este poema cheio de luz e de esperança, como um talismã contra os dias conturbados que vivemos.  

Natália Correia, pintura de Carlos Bottelho

                    Ode à Paz

Pela verdade, pelo riso, pela luz, pela beleza,
Pelas aves que voam no olhar de uma criança,
Pela limpeza do vento, pelos actos de pureza,
Pela alegria, pelo vinho, pela música, pela dança,
Pela branda melodia do rumor dos regatos,
Pelo fulgor do estio, pelo azul do claro dia,
Pelas flores que esmaltam os campos, pelo sossego dos pastos,
Pela exactidão das rosas, pela Sabedoria,
Pelas pérolas que gotejam dos olhos dos amantes,
Pelos prodígios que são verdadeiros nos sonhos,
Pelo amor, pela liberdade, pelas coisas radiantes,
Pelos aromas maduros de suaves outonos,
Pela futura manhã dos grandes transparentes,
Pelas entranhas maternas e fecundas da terra,
Pelas lágrimas das mães a quem nuvens sangrentas
Arrebatam os filhos para a torpeza da guerra,
Eu te conjuro ó paz, eu te invoco ó benigna,
Ó Santa, ó talismã contra a indústria feroz.
Com tuas mãos que abatem as bandeiras da ira,
Com o teu esconjuro da bomba e do algoz,
Abre as portas da História,
                     deixa passar a Vida! 

 

 Natália Correia, Inéditos, 1985/1990