Pintura de George Tooker |
Como custa acordar para uma realidade que não queremos aceitar. Um arrepio, uma brisa amarga e fria percorre o meu ser, o meu corpo material e imaterial, deixa-os ambos estáticos, despovoados, vazios de si. E lembra-me, recorda-me, faz questão de me sussurrar aqueles encantos queridos que me fizeram cair incessantemente, outrora. Ilusões, doces ilusões. Uma vida inteira. Uma fantasia errante farta de sentimentos demasiado puros, demasiado reais.
Fui forçada a dançar este vento tanta vez, sei-o de cor, conheço os seus impulsos e as suas tentações, quando me acaricia, quando me consome e me projeta contra as infindas paredes da sua alma. Encontra sempre forma de me magoar. E eu ergo os meus braços novamente, para que se una a mim, para que eu abrace uma dor e tortura necessárias. E o fado repete-se, o meu corpo enfraquecido procurando a afeição ingrata daquele que me sorve as forças, do meu amor ardente.
Erros meus. Nem a minha agonia me move. Que agradável martírio este. Nunca conheci outra forma, dou-me porque nada mais tenho para oferecer. Erro meu. Dou por mim a ensaiar os mesmos movimentos erráticos, volto a ouvir a melodia melosa que acompanha a minha cegueira e obedeço-lhe como um corpo amestrado que reage a um impulso. Forço-me a cair, mas desta vez, já não há vento que me receba. Deixo-me ficar. Estática, vazia, inconsciente da minha dor. Sinto o peso do meu corpo a ser comprimido contra o chão húmido e glaciar.
Mas não. Ele é apenas leve e frágil, suavemente pousado sobre as areias finas e translúcidas da minha inocência. Eu apenas me deixei ficar, deixei-me sempre ficar. Mas hoje, não. Hoje, levanto-me e sigo.
Carolina Couto, 10ºE
1 comentário:
Uma bela revisitação do texto camoniano. Parabéns, Carolina!
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