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22 de setembro de 2023

TODOS OS COMEÇOS SÃO DELICADOS

 Fomos hoje "repescar" a primeira publicação deste blogue: foi em novembro de 2012. Passaram onze anos! Essa publicação tinha como tema uma frase inspiradora: Todos os começos são delicados. E é bem verdade. Mas os recomeços podem sê-lo também, dado que buscam um equilíbrio, nem sempre fácil, entre o imperativo da novidade e a importância de não perder a ligação ao projeto-raíz.

Aqui fica então essa primeira publicação, in memoriam, num ano em que a escola se propõe revisitar a sua própria história. Com os votos, é claro, de um excelente ano letivo. Em que muito se aprenda e em que não falte o humor gaiato dos nossos alunos.

Foto de Jean Dieuzaide, A conta de somar, 1955
 

E porque não abrir com algumas sugestões de leitura, uma pequena série de títulos iniciáticos? Aqui vai o primeiro, sob a égide de Joseph Joubert:


"O maior defeito dos livros novos é impedir a leitura dos antigos."

 
Não que os livros novos desmereçam a nossa atenção, pelo contrário, mas quão inestimáveis são tantos dos que atrás deles se vão silenciando e ocultando. Aqui fica pois a sugestão de um conto escrito nos anos 60 do século passado - um conto cheio de alegria e de juvenil descoberta da vida.
 
CONSTANTINO, GUARDADOR DE VACAS E DE SONHOS

Tem doze anos, mas não deitou muito corpo para a idade. Ainda está a tempo. Um homem cresce até ao fim da vida, se não em altura, pelo menos em obras e ambições. E nisso promete.

Por voto do padrinho e assentimento dos pais, recebeu no registo o nome de Constantino. É um nome bonito, sim senhor. Na aldeia não há outro igual, e isso é bom, pensou a mãe; escusa uma pessoa de matar a cabeça como em certas casas em que os homens usam o mesmo nome e ninguém se entende. Na Chamboeira conheceu ela uma mulher, a Ti Pirralha, metida num inferno de portas adentro por causa de o marido, o filho e o neto se chamarem António.

Enquanto o rapaz foi pitorro, tudo correu bem. Um era o António Grande, o outro só António e o mais novo o António Pequeno, O rapaz porém, deitou muito corpo, e depressa, enquanto o avô continuou cartaxinho, cartaxinho e melindroso, pois começou a pôr-se de vidro fino quando a mulher lhe chamava Grande, vendo nisso uma artimanha dela para se vingar de certas desfeitas que lhe fazia quando bebia um copo a mais.

«Grandes são os burros», refilava então o velho, muito rezingão, com reumático nas cruzes, umas dores parvas como dentadas de lobo. Mas andou tudo raso naquele casal quando a Ti Pirralha o tratou por António Velho para chamar Novo ao neto, o que incendiou o marido, e de tal jeito que a mulher teve de se esconder três dias em casa duma vizinha.

«Velhos são os trapos!», gritava o António Pirralha chamando corja ao povo inteiro da sua aldeia – que não gostava muito dele, valha a verdade.

Foi isto mais ou menos o que a mãe do Constantino lembrou ao marido para defender o nome escolhido pelo compadre. Constantino era um nome bonito para rapaz.

                        Alves Redol, Constantino, Guardador de Vacas e de Sonhos, Editorial Caminho, Lisboa, 20ª edição

8 de maio de 2016

Biblioteca de Livros Digitais



A Biblioteca de Livros Digitais está integrada no Plano Nacional de Leitura, e reúne livros de autores consagrados e aprovados pelo PNL, bem como um repositório de trabalhos realizados por pessoas interessadas em criar textos motivados pelos livros que acabaram de ler.


A Biblioteca é um lugar de partilhas, de troca de experiências, agregador de todos quantos promovem o prazer de ler e estão interessados em alargar o seu ciclo de amigos e conhecidos.


14 de janeiro de 2015

Ler Gabriel Garcia Marquez


Gabriel García Marquez (1927-2014), escritor colombiano, criador do chamado realismo mágico sul-americano e vencedor do prémio Nobel da literatura em 1982, foi um dos mais notáveis escritores do século XX, como atestam os seus fabulosos romances Cem anos de Solidão ou O Amor nos Tempos da Cólera.


Para aqueles que leem em castelhano, alguns dos seus grandes livros estão disponíveis na rede e podem ser descarregados gratuitamente em PDF:


12 de setembro de 2014

O Projecto Adamastor




Uma biblioteca digital de obras literárias em português, disponibilizadas de forma gratuita. Na página inicial do Projecto Adamastor, pode ler-se: 

O mercado do livro digital, que nos últimos anos tem vindo a crescer significativamente no estrangeiro, começa agora a desenvolver-se no nosso país (...). No entanto, tal desenvolvimento está limitado pela insuficiente oferta de títulos em português (...).
Neste sentido, o Projecto Adamastor tem como principal objectivo atenuar essa escassez através da criação de uma biblioteca digital de obras literárias em domínio público, obras essas que serão disponibilizadas de forma gratuita e em formato EPUB, sem qualquer tipo de restrição.
Tal não significa que o projecto se resuma à mera conversão de textos disponíveis online, bem pelo contrário: os colaboradores do Projecto Adamastor procuram acrescentar valor através de uma revisão cuidada de cada obra, de modo a minimizar o número de erros e a atingir uma versão fiel ao original, actualizada de acordo com a ortografia vigente. Tudo isto acompanhado por um design atractivo.

4 de agosto de 2014

Leituras para férias

Em espanhol, autores como Borges, Cortazar, Maupassant, Allan Poe, Raymond Carver, García Marquez... Disponibilizados em Biblioteca de cuentos y relatos. Vale a pena passar por lá.

Cuentosinfin

Biblioteca de cuentos y relatos

20 de janeiro de 2014

100 anos de Platero



Saíu hoje o número 20 da revista Blimunda, da Fundação Saramago, que pode descarregar-se aqui.

Neste número, destacamos um trabalho acerca de Platero e eu, o delicioso livrinho de Juan Ramon Jiménez, sobre cuja publicação se cumprem 100 anos.

Nunca deixamos de recomendar a sua leitura aos nossos alunos, pois Platero e eu cumpre muitos dos requisitos que lhes agradam: é pequeno, é alegre e gira em torno de uma personagem que nos cativa o coração: o burrinho Platero, amigo e meio de transporte do autor, com quem este mantinha uma relação que mais facilmente imaginaríamos ter com um cão ou com um gato. 

Feliz centenário, Platero!

12 de abril de 2013

Contos Impopulares


As aulas já tinham terminado e eu estava curioso sobre o livro que tinha requisitado na Biblioteca. Daí, perguntei à minha mãe:

– Ó mãe, já ouviu falar da Agustina Bessa-Luís?
– Já, mas há muito tempo que não se ouve falar dela. Por aquilo que sei, é uma escritora muito famosa, mas nunca li nenhum livro dela. Acho que a Agustina ainda não morreu; mas porque perguntas? É mais algum livro que trazes para ler, além d’Os Maias?

E a conversa foi continuando. Mais tarde, fui pesquisar sobre a autora. Descobri que esta ilustre senhora de noventa anos deixara de ser falada na comunicação social, talvez devido à idade avançada e à doença. Descobri ainda que Maria Agustina Ferreira Teixeira Bessa-Luís é uma escritora portuense que, aos 26 anos, publicou a sua primeira obra de ficção; mas o sucesso só chegou em 1954, com a publicação do livro A Sibila

Descobri ainda que Agustina, além de romancista, faz parte da Academia de Ciências de Lisboa; da Académie Européenne des Sciences, des Arts et des Lettres de Paris; e da Academia Brasileira de Letras. Também foi diretora do jornal Primeiro de Janeiro e do Teatro Nacional D. Maria II. Várias das suas obras foram adaptadas ao cinema, pelo amigo e realizador Manoel de Oliveira. E, entre vários reconhecimentos e prémios que recebeu, destaca-se o Prémio Camões, o prémio literário mais importante da língua portuguesa.

O livro que li, Contos Impopulares, é uma coletânea de contos escritos entre 1951 e 1953. De entre catorze contos que constituem o livro, farei menção a quatro. Contos populares são contos passados de geração em geração numa linguagem oral, e conhecidos pelo senso-comum. Mas o título desta publicação, Contos Impopulares, remete-nos para contos bem diferentes desses. 

O primeiro, O Búzio, fala de um homem que estava doente; e, na sua melancolia, ouvia sons de piano através de uma vizinha. A sua casa assemelhava-se a um búzio porque ele era um ser encurralado e fechado em si mesmo. Como o próprio conto diz, «A própria casa era como um desses búzios de aroma salino e que contém dentro um ser encarquilhado, morto, brilhando viscosamente no seu antro de porcelana».

Já o segundo conto, Míscaros, fala de um jovem estudante que pretendia atravessar o rio num barco e que foi enganado pelo empregado da bilheteira, tendo de pagar dois bilhetes para fazer a travessia. Estando o jovem revoltado com a situação, esfarelou o bilhete e atirou-o à agua. Quando ia embarcar, foi acusado de querer viajar de borla, pelo que teve de comprar mais outro bilhete. Este pequeno conto mostra que muitas vezes os jovens agem de cabeça quente e fazem coisas de que se arrependem. 

Em O Cortejo, o provérbio “Quem muito espera, desespera” é observável através de um homem que espera impacientemente um cortejo que há-de passar em frente da uma janela de sua casa. De tanto esperar, o homem adormece encostado ao parapeito e, quando acorda, fica na dúvida se já teria passado o cortejo. Mas continua infindavelmente à espera que algo aconteça. 

No sétimo conto, O Torneio, há uma competição cujo objetivo é balear pombos. Quando um pombo era atingido, ouvia-se uma grande salva de palmas do público, na bancada. No entanto, um pombo conseguiu escapar. No silêncio que se seguiu, ouviu-se só o bater de palmas de José que, entre a troça dos outros, teve de se retirar, envergonhado. Este conto mostra-nos que quando nos opomos àquilo que a sociedade em geral aprova, corremos o risco de ser julgados e ridicularizados.

Gostei de ler os contos “impopulares” da Agustina Bessa-Luís, porque, através da ironia, fazem-nos pensar sobre a realidade. Termino com um excerto do conto Espaço para Sonhar:

«Uma boa história é a que nos comunica a consciência da nossa individualidade. Todos nós somos protagonistas duma história maravilhosa, mas só o artista pode desvendar a profundidade em que ela se desenrola, trazendo à superfície a suprema aventura da individualidade humana.»

CONTOS IMPOPULARES, de Agustina Bessa-Luís, Guimarães Editores, Lisboa, 2004, 5ª edição.

Tiago Silva, 11º B

24 de fevereiro de 2013

Livros gratuitos online

Graças a uma iniciativa da rede ibero americana de colaboração universitária, todos os dias poderá ser descarregada gratuitamente uma obra literária - em formato PDF - na página da Universia Brasil.  
Os arquivos incluem publicações nacionais e internacionais. O primeiro título disponibilizado foi O Feiticeiro de Oz. Para os próximos dias, estão listados clássicos como O Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente, A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas,  O Anticristo, de Nietzsche, e Anna Karenina, de Tolstoi.

Para baixar os livros basta aceder à página do Universia. 



19 de novembro de 2012

Todos os inícios são delicados

E porque não abrir com algumas sugestões de leitura, uma pequena série de títulos iniciáticos? Aqui vai o primeiro, sob a égide de Joseph Joubert:

"O maior defeito dos livros novos é impedir a leitura dos antigos."

Não que os livros novos desmereçam a nossa atenção, pelo contrário, mas quão inestimáveis são tantos dos que atrás deles se vão silenciando e ocultando. Aqui fica pois a sugestão de um conto escrito nos anos 60 do século passado - um conto cheio de alegria e de juvenil descoberta da vida.


CONSTANTINO, GUARDADOR DE VACAS E DE SONHOS

Tem doze anos, mas não deitou muito corpo para a idade. Ainda está a tempo. Um homem cresce até ao fim da vida, se não em altura, pelo menos em obras e ambições. E nisso promete.

Por voto do padrinho e assentimento dos pais, recebeu no registo o nome de Constantino. É um nome bonito, sim senhor. Na aldeia não há outro igual, e isso é bom, pensou a mãe; escusa uma pessoa de matar a cabeça como em certas casas em que os homens usam o mesmo nome e ninguém se entende. Na Chamboeira conheceu ela uma mulher, a Ti Pirralha, metida num inferno de portas adentro por causa de o marido, o filho e o neto se chamarem António.

Enquanto o rapaz foi pitorro, tudo correu bem. Um era o António Grande, o outro só António e o mais novo o António Pequeno, O rapaz porém, deitou muito corpo, e depressa, enquanto o avô continuou cartaxinho, cartaxinho e melindroso, pois começou a pôr-se de vidro fino quando a mulher lhe chamava Grande, vendo nisso uma artimanha dela para se vingar de certas desfeitas que lhe fazia quando bebia um copo a mais.

«Grandes são os burros», refilava então o velho, muito rezingão, com reumático nas cruzes, umas dores parvas como dentadas de lobo. Mas andou tudo raso naquele casal quando a Ti Pirralha o tratou por António Velho para chamar Novo ao neto, o que incendiou o marido, e de tal jeito que a mulher teve de se esconder três dias em casa duma vizinha.

«Velhos são os trapos!», gritava o António Pirralha chamando corja ao povo inteiro da sua aldeia – que não gostava muito dele, valha a verdade.

Foi isto mais ou menos o que a mãe do Constantino lembrou ao marido para defender o nome escolhido pelo compadre. Constantino era um nome bonito para rapaz.

                        Alves Redol, Constantino, Guardador de Vacas e de Sonhos, Editorial Caminho, Lisboa, 20ª edição, 1990